quarta-feira, 8 de junho de 2011

EM FUGA, JUAN PERÓN PASSA PELA BASE AÉREA DE AMAPÁ

                  
             Por Nilson Montoril


Cabo Alfredo Oliveira e Juan Domingo Perón em frente a cada do Diretor da Escola de Iniciação Agrícola de Amapá. A menina à frente de Peron é Ionilde, flha do Cabo Alfredo e de Dona Ione Olivera . Esta também aparece na fotografia, no interior da casa.
                                                        
            No dia 4 de novembro de 1955, o cabo do Exército e Professor Alfredo Oliveira viveu uma das maiores emoções de sua vida. Até às 16h30min daquele dia de forte calor, o tempo transcorria sem grandes novidades. Alfredo Oliveira, então diretor da Escola de Iniciação Agrícola de Amapá havia levado os alunos do estabelecimento de ensino a uma fábrica de farinha e explicava-lhes como deveria ocorrer seu funcionamento. Em dado momento chegou ao local o carpinteiro João Lima, dirigindo um trator com pneus, vulgarmente chamado de “jerico”, informando ao Cabo Alfredo que acabara de chegar à Base Aérea um homem alto, forte, que fumava muito e dizia chamar-se Perón. Como o sujeito falava meio enrolado e as pessoas presentes no local onde o visitante de encontrava não entendiam direito o que ele dizia, pediram ao tratorista que fosse chamá-lo para atender o estranho. João Lima também disse que o meio de transporte utilizado pelo “seu Perón” era um avião da Força Aérea Paraguaia. Alfredo Oliveira sabia que Juan Domingo Perón havia sido deposto do cargo de Presidente da Argentina pelos militares e fugira para Assunção, capital do Paraguai, mas nunca pensou vê-lo transitando pela Base Aérea de Amapá. Deixando os alunos sob orientação dos monitores da Escola de Iniciação Agrícola, cabo Alfredo embarcou no “Jerico” e rumou para o aeroporto. Ficou perplexo quando constatou que se tratava mesmo do senhor Juan Domingos de Perón, ex-presidente da Argentina. Cumprimentou o ilustre homem público e indagou como a fuga foi realizada, haja vista que o avião cedido pelo governo do Paraguai era um C-47 com pouca autonomia de vôo e que jamais chegaria à Base Aérea de Amapá sem pousar em território brasileiro para se abastecer de combustível. O General Juan Domingo Perón disse que lhe faria o relato da fuga de modo reservado. Imediatamente, Alfredo Oliveira foi a estação telegráfica da Base Aérea e passou um telegrama ao governador Janary Gentil Nunes transmitindo-lhe a bombástica notícia. Mesmo ciente de que represálias poderiam ser tomadas contra sua atitude, Janary Nunes autorizou que Cabo Alfredo hospedasse o general e lhe desse todo o apoio necessário. Ainda usando o trator, Alfredo Oliveira levou o ex-presidente argentino para sua residência, onde se encontrava o engenheiro agrônomo Jorge Nova da Costa, então chefe da Seção de Fomento Agrícola de Amapá, que colocou à disposição do visitante um Jeep Willyan a fim de que se tornasse viável dar ao fugitivo o melhor atendimento possível. A esposa do Cabo Alfredo, senhora Ione Oliveira arrumou os aposentos destinados a Perón, ao comandante do avião e à aeromoça. Perón confessou que estava enjoado de comer tanta sardinha e desejava alimentar-se com algo melhor. Um jantar bem apetitoso lhe foi servido, ao fim do qual, numa longa conversa que dominou a todos, Perón narrou sua aventura. 

Juan Domingo Perón tomando café em companhia de seu anfitrião, Cabo Alfredo Oliveira

Disse que após o golpe militar que o tirou do governo da Argentina fugiu para a capital do Paraguai. Ali foi bem recebido pelo presidente Alfredo Stroessner que lhe emprestou o aparelho utilizado na fuga, um Douglas C-47, com dois motores à hélice, que pertencia à Força Aérea Paraguaia. O avião deixou a cidade de Assunção ao amanhecer de 2 de novembro de 1955, quarta-feira, dia de finados, direto para São Paulo, aterrizando no aeroporto de Congonhas. Perón pediu exílio às autoridades brasileiras, mas não foi atendido. Só obteve autorização para abastecer a aeronave e seguir em frente. A partir de São Paulo foi colocado em prática o plano de fuga que compreendia uma arriscada jornada no sentido norte do Brasil, Guiana Francesa e Caribe. Uma missão tão complicada para a época exigia um piloto experiente no comando da aeronave. Foi prevendo essa possibilidade que a Força Aérea Paraguaia designou o Major Nivac para comandar o avião. Ele tinha conhecidos na Força Aérea Brasileira, notadamente no aeroporto Santos Dumont. Tinha feito cursos no Campo dos Afonsos e falava bem o português. A aeromoça era na verdade uma funcionária graduada do Gabinete da Presidência da República do Paraguai que falava vários idiomas.

            De São Paulo o Douglas C-47 seguiu para o Rio de Janeiro. Aterrisou por volta das 14 horas no aeroporto Santos Dumont e permaneceu no solo por 20 minutos, tempo estritamente necessário para o abastecimento da aeronave. Ninguém da imprensa e das Forças Armadas do Brasil tomou conhecimento da operação ou todos fizeram vista grossa. Devidamente abastecido de gasolina própria para a aviação, o aparelho decolou com destino a Salvador, aonde chegou ao anoitecer. Perón e seus colaboradores pernoitaram no interior do avião. Ao amanhecer do dia 3 de novembro, quinta-feira, reabastecido, o C-47 ganhou os ares para uma empreitada tão comum para os pilotos brasileiros: voar sobre a região centro oeste, á época quase desabitada e sem campos de pouso. A capacidade do tanque de combustível do avião não permitiu que ele passasse de São Luiz, Estado do Maranhão. A noite já dominava a capital gonçalvina quando o Douglas C 47 pousou no aeroporto do Tirirical. Desde o inicio da viagem os ocupantes do avião só tinham tempo de almoçar e jantar sardinhas enlatadas, que sequer eram esquentadas. Dia 4 de novembro, sexta-feira, antes do sol raiar, o Douglas já estava nas alturas. 

Avião Douglas C-47 T-25 da Força Aérea Paraguaia

A pretensão do Major Nivac era pousar em Caiene, na Guiana Francesa, mas as autoridades locais disseram que precisariam consultar o Governo Francês, em Paris, sobre a conveniência de permitir a presença de Perón no citado Departamento Ultramarino da França. Como a autorização foi negada, Perón tentou obter combustível junto ao destacamento da Aeronáutica sediada na Base Aérea de Amapá. O oficial do destacamento via telégrafo manteve contato com o comando da 1ª Zona Aérea, sediada em Belém, mas o atendimento foi negado. O combustível existente no tanque do Douglas C-47 era insuficiente para um vôo até  Paramaribo. Neste momento pousou na Base Aérea o avião monomotor Bonanza, de propriedade do Governo do Amapá pilotado por Hamilton Henrique da Silva, conduzindo o jornalista Agostinho Nogueira de Souza, cuja missão era entrevistar Juan Domingos Perón para o Jornal Amapá e Rádio Difusora de Macapá. Hamilton Silva disse ao Comandante Novac que um pouco de gasolina comum não causaria problemas aos motores do C-47. Assim, a gasolina do tanque de um caminhão foi retirada e adicionada ao combustível do avião paraguaio. Antes da decolagem o comandante Novac testou bem o funcionamento dos motores. No dia 5 de novembro de 1955, um sábado, o ex-presidente Juan Domingo de Perón deixou o território brasileiro rumando para a Guiana Holandesa, onde o avião foi abastecido. De Paramaribo, Perón buscou e conseguiu exílio em Manágua, capital da Nicarágua. Posteriormente foi para a Espanha. 

2 comentários:

Paulo César disse...

Professor Nilson,
e a entrevista com o jornalista Agostinho Nogueira de Souza? houve?

Luiz Oliveira disse...

Olá, sou neto do saudoso Alfredo Oliveira. O nome da minha avó é Ione e não Dione. A filha que aparece na foto com meu avô e Perón é minha mãe (Ionilde). Parabéns pelo blog, abraços! Luiz Alfredo Oliveira