terça-feira, 12 de novembro de 2013

BICICLETAS EM MACAPÁ

      
      BICICLETAS EM MACAPÁ

      Por  Nilson Montoril
 
Veiculo construído de madeira segundo desenho feito por Leonardo da Vinci, em 1490.

                        Acredita-se que o primeiro engenho humano semelhante à bicicleta surgiu na China. Entretanto, entre os desenhos fantásticos concebidos por Leonardo da Vinci, corresponde a um veículo com duas rodas, que seria moldado em madeira. O desenho é de 1490 e inspirou o celerífero. Em 1817, o alemão Barão Karl Von Drais construiu um veículo a partir do celerífero feito em madeira. Porém, a bicicleta como o mundo conhece surgiu em 1880, na Inglaterra. Bicicleta é uma palavra originária do latim bi (duas) e do grego kiklos (rodas), com incursões pelo inglês bicycle, pelo diminutivo Frances bicyclette e pelo castelhano bicicleta. São inúmeras as marcas de bicicletas que se espalharam pelo mundo. No Brasil, a mais famosa delas foi a bicicleta Hércules, fabricada na Inglaterra graças a iniciativa de Edmond Crane, conhecido como Ted Crane.
Modelos nada convencionais fabricados em 1890, na Inglaterra. Os ciclistas tinham que possuir muito equilíbrio para poder  usá-los. É claro que uma mulher sentir-se ia extremamente desconfortável para sair pedalando algo tão esquisito.

 Ele foi o fundador da fábrica de bicicletas Hércules. Ted era filho de Jack Crane, que iniciou a vida empresarial fabricando 25 bicicletas por semana, em sua Companhia Ciclo Petroo, em Coventry Street, na cidade de Birmingham. Os veículos eram fortes e duráveis, justificando o nome que lhe foi dado. O velho Jack Crane contou com a ajuda dos filhos Ted e Harry em seu empreendimento, mas a robustez e o preço do veículo acabaram levando a empresa á falência. As bicicletas que não tinham sido vendidas com emissão de documento fiscal foram negociadas contrariando normas legais, fato que gerou problemas jurídicos para a família Crane.
A empresa cujo nome é visto no frontispício do prédio chegou a negociar cerca de um milhão de bicicletas.

 Em 1910, depois de livrarem-se do processo de conspiração econômica, os irmãos Crane decidiram criar a firma Ciclo Hércules and Motor Company. Iniciaram fabricando 25 veículos por semana e depois alcançaram a marca de 70 bicicletas. Em 1914, a fábrica obteve a produção de 10.000 bicicletas. Em 1923, Ted e Harry Crane compraram uma fábrica de pneus e câmaras de ar e iniciaram a construção de suas próprias peças. A bicicleta veio da Europa para o Brasil em 1898, no final do século XIX. Devido à migração alemã, ela foi inicialmente popularizada no Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Aos poucos o veículo foi se tornando conhecido no restante do país. A bicicleta era importada desmontada. Apenas selins e pára-lamas eram fabricados no Brasil. 
A bicicleta que aparece em primeiro plano corresponde a um triciclo e tem até bagageiro. O casal que fazia uso do veículo vestia-se com elegância e ambos pedalavam.

Dominavam o mercado brasileiro as marcas Bianchi, Lanhagno, Peugeot, Duphopp, Phillips, Hércules, Raleigh, Prosdócimo, Singer, Caloi e Monark, todas importadas dos Estados Unidos da América. Em meados de 1940, devido à 2ª guerra mundial, que se espalhou pela Europa, o presidente Getúlio Vargas restringiu a entrada de produtos estrangeiros e estimulou a fabricação dos mesmos no Brasil, inclusive bicicletas. Entre 1950 e 1970, havia 30 fábricas no país e mais de 50 marcas e modelos. Em 1980, a Monark e a Caloi dominavam 95% do mercado. No último mês de agosto de 2013, a Caloi, que era a maior fabricante de Bicicletas da América Latina, com sede em Manaus, vendeu 70% de suas ações para a canadense Dorel Industries e hoje só detém 40% do mercado.
Vistosa bicicleta da marca Hércules devidamente equipada nos termos das normas existentes para que elas pudessem trafegar. O majestoso veículo possui luzes no para-lama e no garfo traseiro, dínamo, farol, bomba para encher as câmaras de ar, bagageiro e placa expedida pelo órgão de trânsito. Em Macapá, essas exigências também existiram.

 Não há registros formais sobre a existência de bicicletas em Macapá antes da criação do Território Federal do Amapá, em 1943. Elas começaram a aparecer na cidade a partir do ano de 1945. A casa Leão do Norte, então administrada pela família Zagury foi a primeira a vender os fascinantes veículos da marca Hércules. Em pouco tempo, quem não possuía uma bicicleta podia alugá-la pagando um cruzeiro à hora. O negócio era mantido pelo macapaense Francisco Marques Picanço, o Mixico, que ainda reside na capital do Amapá O próprio Mixico fazia a manutenção de suas bicicletas e montava e lubrificava as que eram vendidas na Casa Leão do Norte, onde trabalhava.
Foto tirada na Fazendinha, dia 13 de setembro de 1950.Em primeiro plano vemos alunas do Grupo Escolar Barão do Rio Branco. A 3ª estudante da 1ª fila é minha irmã Neyde Montoril de Araújo, integrante da Guarda de Honra à Bandeira Nacional.As alunas da Escola Normal de Macapá usavam camisas brancas de mangas compridas. Nota-se que algumas delas iriam desfilar em bicicletas.

 No decorrer de vários anos o Mixico destacou-se como o melhor ciclista da cidade, representando a Congregação Mariana e o Juventus Esporte Clube. Andar pedalando uma bicicleta Hércules dava um prestigio danado, notadamente se o veículo fosse próprio. O Mixico tinha umas 3 ou 4 bicicletas, todas impecáveis quanto ao estado de conservação. Creio que, atualmente, apenas o José do Carmo Tavares, o Zeca Eletricista é o único cidadão de Macapá a manter em funcionamento suas duas bicicletas da marca Hércules. E saiba que o Zeca tem mais de 80 anos de idade e todos os dias transita pelas ruas de Macapá.
 
A professora Predicanda Lopes(vestido escuro e óculos), então Diretora da Escola Normal de Macapá e diversas alunas do educandário,cercam a aluna Ahelhina Alencar e o aluno José Ubirajara de Souza que desfilariam em bicicletas no dia 7 de setembro.

                        Comprar uma bicicleta da marca Hércules não era privilégio reservado a qualquer um. O preço era salgado se comparado ao de outras marcas que depois foram aparecendo. A Casa Leão do Norte manteve a primazia de vender com exclusividade, por muitos anos, as bicicletas Monark. Foi neste estabelecimento comercial que, em 1966, comprei minha única bicicleta, um modelo com barra circular intitulado “Monark Copa do Mundo”. Antes, tive o prazer de pedalar uma bicicleta Goricke (fabricação alemã) e outra Mercswiss (fabricação totalmente brasileira), que pertenceram respectivamente as minhas irmãs Nice e Nancy. Lembro que a logomarca da Mercswiss era uma bela caravela, cuja placa vinha presa com rebites na parte do quadro por onde era embutido o garfo da roda dianteira e o guidom. Eram alvo de admiração as bicicletas utilizadas pelos padres italianos. 
Prova de ciclismo entre alunas dos estabelecimentos secundários de Macapá por ocasião da Primeira Olimpíada Estudantil. As seis atletas estão prontas para a largada, na Rua São José, esquina com a Avenida Iracema Carvão Nunes. O circuito compreendia o quadrilátero em torno da Praça Barão do Rio Branco com tempo controlado em cronômetro. Observa-se a presença do Professor Edésio Lobato, Diretor do Instituto de Educação passando por trás da 2ª ciclistas,próximo ao poste da rede elétrica.A marca de bicicleta que prevalecia era a Monarck.

Elas pareciam ser frágeis, mas suportavam muito bem o corpanzil do Irmão Leigo Francesco Mazollene, o famoso Catterpilar. Esse devotado religioso transportava com freqüência, sobre os ombros, um quarto trazeiro de carne bovina que os membros do Pontifício Instituto das Missões Estrangeiras consumiam na então Prelazia de Macapá. Fazia isso subindo a Rua Cândido Mendes, trajeto compreendido entre o Frigorífico Territorial (que ficava na esquina da citada rua com a Avenida Coaracy Nunes) e a Casa dos Padres, na Rua São José. As duas primeiras bicicletas oriundas da Itália, ambas da marca Bianchi, fabricadas em Treviglio, Milão a partir de 1885, pela fábrica de Edoardo Bianchi, chegaram a Macapá no dia 5 de outubro de 1948. 
Bicicleta Bianchi igual aos primeiros veículos italianos da citada  marca chegarem a Macapá, em 1948. Leves,mas robustas, as bicicletas podiam transpor os obstáculos existentes na periferia de Macapá. Os Padres do PIME que não sabiam pilotar as famosas moto Guzzi usavam as bicicletas Bianchi.
Elas vieram por via marítima até Belém e daí para Macapá em embarcações do governo territorial. Estavam montadas e prontas para uso imediato. Os dois maiores utilizadores das bicicletas eram o Padre Lino Simonelli e o irmão Francisco. O Padre Lino virava Macapá de cabeça pra baixo. Muito brincalhão, ele mesmo apitava com a boca para afastar apalermados do caminho. Ia freqüentemente pregar o catecismo na periferia da cidade, notadamente no Igarapé das Mulheres (Perpétuo Socorro) e o Morro do Sapo, assim denominada a parte alta no final da Rua São José, antes um precaríssimo caminho cortado por um braço do igarapé da Companhia, área que depois foi rasgada para a abertura da Avenida Nações Unidas.
Carlos Zagalo(camisa clara) e Nilson Montoril(camisa quadriculada) com suas bicicletas Monarck 12966 Copa do Mundo. A bicicleta do Zagalo era azul e branca. A minha era verde e branca.Ambas possuíam dínamo, farol e pneu balão.Sobre a ponta do para-lama dianteiro havia uma bola de futebol em miniatura,na cor branca. A foto foi tirada na parte posterior da Fortaleza São José, próximo ao Rio Amazonas.
 Nessas andanças pela periferia da cidade o Padre Lino contava com a colaboração do médico Diógenes Gonçalves da Silva, que fazia uso de uma velha bicicleta da marca Hércules trazida de Belém. Outra marca bicicleta que eu conheci e andei foi a Gulliver, fabricada em Bonsucesso no Rio de Janeiro pela firma “B Herzog”, pertencente à família de Leon Herzogera, seu fundador. Isso ocorreu a partir de 1951, e o veículo era de ótima qualidade. Em 1939 Leon Herzog possuía uma pequena fábrica na Polônia, mas a ocupação do país pela Alemanha o fez perder tudo. Em 1945, após a segunda guerra mundial Leon migrou para o Brasil. Sua lojinha de Bonsucesso cresceu até virar fábrica. Entretanto, devido a desentendimentos entre os familiares acionistas a firma encerrou suas atividades no final da década de 1950. As bicicletas de hoje são mais bonitas, leves, resistentes, mas perderam o encanto de outrora. Porém, a bicicleta é disparadamente, o veículo mais usado em todo o mundo

O  simbolo da bicicleta Mercswiss, exposto na quadro do veículo, corresponde a uma caravela. A bicicleta que vemos na imagem tinha varão,portanto destinada a homem. O modelo feminino era mais bonito.Minha irmã Nancy possuía uma e eu era seu sócio clandestino.

Velha bicicleta Haleigh equipada com dínamo, farol e buzina
A bicicleta vermelha da fotografia é uma Gulliver equipada com descanso, dínamo instalado no garfo dianteiro e farol
Bicicleta inglesa Hércules de 1928. Essa marca prevaleceu no volume de vendas em Macapá a partir de 1945. Pelo menos dois veículos iguais a que vemos na foto ainda existem na cidade e ambos pertencem ao macapaense José do Carmo Tavares, o Zeca Eletricista