A
SANTINHA DE MACAPÁ
Nilson Montoril
Quando
exerceu o cargo de vigário da paróquia de Macapá, entre 1913 a 1922, o Padre Julio
Maria Lombaerd decidiu criar uma escola onde as meninas receberiam instrução
educacional e religiosa. Surgiu, porém um sério problema, haja vista que nenhum
instituto que ele consultou dispunha de irmãs que pudessem ser deslocadas para
Macapá a fim de dirigir o estabelecimento de ensino. Padre Júlio não pretendia
criar um novo convento, mas convenceu-se que somente o fazendo conseguiria
fundar a escola para meninas de Macapá. Recorreu ao Bispo Diocesano de Belém e
dele obteve a permissão para fazer uma experiência. Como ele sempre ia fazer
pregações em conventos de Belém, expôs às freiras e moças que com elas
conviviam seu propósito de criar uma congregação com o nome de “Filhas do
Coração Imaculado de Maria”. Várias moças externaram o desejo de serem
religiosas, mas todas eram pobres e não tinham dinheiro para preparar o
enxoval. Mesmo assim, Padre Júlio aceitou o desafio de trazê-las para Macapá.
Contando com a ajuda de pessoas caridosas ele obteve o mínimo necessário para
instalar a escola e o noviciado. Em uma casa de apenas dois cômodos foram
instalas as três primeiras religiosas. Após um breve período de preparação elas
receberam o hábito de noviças a 8 de dezembro de 1916. Em um cômodo da casa
funcionava a escola e o outro abrigava refeitório, dormitório, capela e sala de
trabalho. No inicio do ano de 1917,
a escola passou a funcionar com uma clientela de 60
meninas. Além das aulas, as meninas aprendiam a costurar, a lavar, a passar, e
a cozinhar. Dentre as alunas havia mais de 20 órfãs com idade entre 13 a 15 anos. Essas moças
vivam na condição de agregadas de parentes ou vinculadas às famílias caridosas,
sem receber educação escolar. Nessa faixa de idade eram presas fáceis dos
homens sem escrúpulos da cidade de Macapá. As Filhas do Coração Imaculado de
Maria ganharam o respeito e admiração das pessoas de bem de nossa cidade. Eram
vistas como exemplo de dedicação à causa do catolicismo e do amor ao próximo.
Uma
das noviças, chamada Raimunda Siqueira Coutinho, filha do casal João Coutinho e
Ana Siqueira Coutinho, nasceu em Macapá no dia 28 de abril de 1905. Ingressou
na “Casa Matriz Noviciado da Congregação das Filhas do Coração Imaculado de
Maria” em 1920, quando tinha 15 anos de idade. Como noviça, a jovem adotou o
nome de Irmã Celeste, a quem o Padre Júlio Maria Lombaerd chamava de “Anjo da
Eucaristia”. No dia 3 de abril de 1922, doente e precisando de cuidados médicos
só disponíveis em Belém, Irmã Celeste foi embarcada no navio “São Pedro”,
contando com o acompanhamento do Padre Júlio. No dia 7 de abril ela faleceu a
bordo da embarcação, sendo sepultada no cemitério de uma pequena comunidade
existente em uma ilhota do arquipélago do Marajó, no Rio Pará (canal sul do Rio
Amazonas) próximo a Belém. Padre Júlio prosseguiu viagem, pois precisava de
tratamento contra uma terrível ferida que tinha na perna direita e que
apresentava sinais de gangrena. Consultado pelo médico Remígio Fernandes, o
vigário de Macapá foi informado de que, se a lesão não recrudescesse fatalmente
sua perna seria amputada.
Padre Júlio retornou a Macapá e passou a rogar pela
interveniência de Irmã Celeste junto a Maria Santíssima. Milagrosamente a
ferida cicatrizou. Em 1927, os restos mortais de Irmã Celeste foram exumados e
trazidos para Macapá. Diariamente a ossada era colocada sobre um encerado, sob
o sol escaldante, para ressecar os restos de tecidos e cartilagens ainda
existentes. Meninas da escola fundada por Padre Júlio se revezavam no decorrer
do dia movimentando varetas com panos atados nas extremidades para espantar as
moscas varejeiras e impedir que elas botassem ovos nos despojos. Depois de
raspados e fervidos em cal, os ossos foram acondicionados em uma urna de
madeira e remetidos para a cidade de Caucaia, no Estado do Ceará, onde residiam
religiosas da congregação fundada pelo Padre Júlio Lombaerd. Ainda hoje, os
restos mortais da Santinha de Macapá repousam na Sala Histórica da Congregação
a qual pertenceu. À Irmã Celeste são atribuídos muitos milagres, mas nunca foi
iniciado o processo de beatificação ou santidade. Antes de ir residir em
Manhumirim, Minas Gerais, Padre Júlio Maria Lombaerd, que alterou esse
sobrenome para “de Lombarde” depois de sua naturalização como brasileiro,
passou por Pinheiro (Icoaraci/Pará) e Rio de Janeiro. Familiares da Irmã
Celeste ainda vivem em Macapá.
Nenhum comentário:
Postar um comentário