quinta-feira, 10 de maio de 2012

 ATO HERÓICO DE UM ASPIRANTE DO EXÉRCITO

 Por Nilson Montoril
                          

Mesmo sem a mão esquerda, Humberto Pinheiro de Vasconcelos continuou na ativa, ministrando instruções sobre o uso de granada, tanto em Vitória-ES como em Belém-PA, no 26º Batalhão de Caçadores. Tinha 48 anos quando matou o jornalista Paulo Eleutério na redação do jornal "O Liberal", na capital paraense. O ato tresloucado maculou seu conceito de herói.
                                                           
                     Em 1934, em Vila Velha-ES, no segundo andar do Quartel do 3º Batalhão dos Caçadores do Exército, o jovem aspirante de 22 anos, Humberto Pinheiro de Vasconcelos, iniciava as instruções sobre manuseio de granadas a 21 recem-incorporados às fileiras do Exército. A granada que ele usava não era de verdade e sempre ficava guardada na segunda prateleira de um armário. Ao abrir a porta do móvel, o aspirante Vasconcelos não encontrou o artefato no local onde costumava guardá-lo. Na primeira prateleira havia uma granada que, certamente, ele julgou ser a utilizada nos treinamento e que alguém tivesse mudado de lugar. Descreveu detalhes sobre o artefato e ressaltou os cuidados que um soldado precisa ter no seu manuseio. Ao retirar o pino de segurança, viu que tinha na mão direita uma granada verdadeira. Correu para a janela pensando jogá-la no pátio, mas no local havia muitas pessoas que assistiam um treinamento. Mandou que os recrutas deitassem no chão. Junto à janela, passou a granada para a mão esquerda e estendeu o braço para o alto e fora do prédio, deixando que o artefato explodisse, arrancando sua mão. 
Fotografia recente o atual 38º Batalhão de Infantaria do Exército sediado em Vila Velha, Espirito Santo. Em 1934, tinha a denominação de 3º Batalhão de Caçadores.Desde 1964, também é conhecido como Batalhão Tibúrcio. Foi nesta corporação, situada na Prainha e no Morro Moreno, que ocorreu o ato heróico do aspirante Vasconcelos, no ano de 1934


                Este ato de bravura foi narrado pelo Jornal “A Noite Ilustrada”, do Rio de Janeiro, edição nº. 215 que circulou no dia 18/4/1934. Em reconhecimento ao heróico feito do aspirante, o Presidente Getúlio Vargas lhe concedeu-lhe o privilégio de permanecer na ativa. Posteriormente, Humberto Vasconcelos foi transferido para Belém. Em 1945, Humberto Pinheiro de Vasconcelos ocupava o posto de capitão, quando o Ministério da Guerra o colocou à disposição do governo do Território Federal do Amapá. Desembarcou em Macapá no dia 7/6/1945, sendo recepcionado no aeroporto da Panair do Brasil pelo governador Janary Nunes, secretário-geral Raul Montero Valdez e Dr. Paulo Eleutério, chefe do Serviço de Informações. Foi nomeado Diretor da Divisão de Segurança e Guarda e Comandante da Guarda Territorial, substituindo o advogado, jornalista e tenente Paulo Eleutério Cavalcante de Albuquerque, ao qual cabe o mérito de ter organizado e instalado a Guarda Territorial, da qual foi o 1º comandante. Além disso, ele já vinha coordenando o Serviço de Informações e Comunicações do Território do Amapá, órgão que gerou o jornal Amapá e a Rádio Difusora de Macapá. 

Aos 22 anos de idade, usando o uniforme de aspirante da Arma de Infantaria do Exército, o aspirante Humberto Pinheiro de Vasconcelos evidencia os danos que a granada causou em sua mão e parte do braço. Nas solenidades militares ele não fazia uso da prótede de borracha. Considerado herói nacional, permaneceu na ativa até atingir o posto de general.

            Filiado ao Partido Social Democrático-PSD do Pará, Humberto Vasconcelos foi guindado à condição de Presidente do Diretório Territorial da referida associação política. Também integrou o grupo de cidadãos que fundou o Rotary Clube de Macapá, sendo o primeiro presidente da entidade. O capitão Vasconcelos usava uma prótese no braço esquerdo, que substituía a mão arrancada por uma granada. Vestia-se com esmero, preferindo roupas brancas. Ficava magoado quando alguém o chamava de mão-de-borracha. Humberto e Eleutério mantiveram convivência cordial enquanto residiram em Macapá. O relacionamento entre eles azedou em Belém à conta do clima político reinante do Pará. O Dr. Paulo Eleutério era secretário de redação do Jornal Liberal, pertencente a Magalhães Barata.

Embora não apresente boa resolução, a cópia da fotografia acima mostra a maioria dos fundadores do Rotary Clube de Macapá. Na primeira fila, usando paletó branco e sentado à esquerda do governador Janary Gentil Nunes,aparece o então capitão Humberto Pinheiro de Vasconcelos. Podemos observar que apenas sua mão direita é mostrada.
                  O capitão Vasconcelos atuava na oposição. A partir de 11/4/1950, os seguidores de Magalhães Barata, que dominavam o governo do Pará, iniciaram uma brutal perseguição a seus adversários, chegando ao cúmulo de dar um banho de fezes no jornalista Paulo Maranhão, dono do Jornal “Folha do Norte”. O atentado foi engendrado por Armando Corrêa, secretário-geral do governador Moura Carvalho. Em artigo publicado no jornal “O Liberal”, dia 19/5/1950, o articulista João Malato colocou em dúvida a masculinidade do capitão Vasconcelos. Na manhã do dia 20, o capitão foi à redação do jornal para tomar satisfações com Malato, mas não o encontrou. Foi então a sala de redação, onde se encontrava o jornalista Paulo Eleutério e, de revólver em punho, passou a agredi-lo verbalmente. Sentindo que as ameaças de morte do capitão fatalmente iriam se concretizar, Paulo Eleutério usou um velho revólver que pretendia levar ao um armeiro e atirou contra o capitão, atingindo-o sem gravidade à direita e à esquerda da clavícula. Ao ficar sem balas, o jornalista tentou se refugiar na gerência do jornal,mas foi surpreendido pelo antagonista. Manuseando uma arma de melhor precisão, o capitão alvejou Paulo Eleutério na perna e nas costa, matando-o. A 3/10/1950, Humberto Vasconcelos, filiado ao Partido Social Pogressista e compondo a Coligação Democrática Paraense, adversária de Magalhães Barata, elegeu-se deputado estadual com 5.018 votos. À conta da imunidade parlamentar adquirida como deputado estadual, Vasconcelos viu o processo instaurado no quartel-general da 8ª Região Militar e o processo judicial fluirem em camera lenta. Algumas testemunhas só foram ouvidas em 1954, quatro anos depois do crime. Ainda assim, testemunha chaves não foram ouvidas no processo militar.No dia 31/7/1951, ocupando a 2ª secretaria da mesa diretora da Assembléia Legislativa do Pará, Humberto Vasconcelos foi promovido ao posto de major do Exército Brasileiro. No transcurso do mandato, ele foi absolvido pelo Tribunal de Justiça do Pará. Ao deixar a Assembléia Legislativa, sentindo forte rejeição por parte da sociedade paraense, o major Humberto Pinheiro de Vasconcelos retornou a Vitória-ES, onde nasceu a 27/5/1912. Quando assassinou o jornalista Paulo Eleutério, Humberto Vasconcelos estava lotado no Departamento Estadual de Segurança Pública. Faleceu no dia 26/1/2002, com 90 anos de idade.

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