Por Nilson Montoril
Em
1934, em Vila Velha-ES,
no segundo andar do Quartel do 3º Batalhão dos Caçadores do Exército, o jovem
aspirante de 22 anos, Humberto Pinheiro de Vasconcelos, iniciava as instruções
sobre manuseio de granadas a 21 recem-incorporados às fileiras do Exército. A
granada que ele usava não era de verdade e sempre ficava guardada na segunda
prateleira de um armário. Ao abrir a porta do móvel, o aspirante Vasconcelos
não encontrou o artefato no local onde costumava guardá-lo. Na primeira
prateleira havia uma granada que, certamente, ele julgou ser a utilizada nos
treinamento e que alguém tivesse mudado de lugar. Descreveu detalhes sobre o
artefato e ressaltou os cuidados que um soldado precisa ter no seu manuseio. Ao
retirar o pino de segurança, viu que tinha na mão direita uma granada
verdadeira. Correu para a janela pensando jogá-la no pátio, mas no local havia
muitas pessoas que assistiam um treinamento. Mandou que os recrutas deitassem
no chão. Junto à janela, passou a granada para a mão esquerda e estendeu o
braço para o alto e fora do prédio, deixando que o artefato explodisse,
arrancando sua mão.
Este ato de bravura foi narrado pelo Jornal “A Noite
Ilustrada”, do Rio de Janeiro, edição nº. 215 que circulou no dia 18/4/1934. Em
reconhecimento ao heróico feito do aspirante, o Presidente Getúlio Vargas lhe
concedeu-lhe o privilégio de permanecer na ativa. Posteriormente, Humberto
Vasconcelos foi transferido para Belém. Em 1945, Humberto Pinheiro de
Vasconcelos ocupava o posto de capitão, quando o Ministério da Guerra o colocou
à disposição do governo do Território Federal do Amapá. Desembarcou em Macapá
no dia 7/6/1945, sendo recepcionado no aeroporto da Panair do Brasil pelo
governador Janary Nunes, secretário-geral Raul Montero Valdez e Dr. Paulo
Eleutério, chefe do Serviço de Informações. Foi nomeado Diretor da Divisão de
Segurança e Guarda e Comandante da Guarda Territorial, substituindo o advogado,
jornalista e tenente Paulo Eleutério Cavalcante de Albuquerque, ao qual cabe o
mérito de ter organizado e instalado a Guarda Territorial, da qual foi o 1º
comandante. Além disso, ele já vinha coordenando o Serviço de Informações e
Comunicações do Território do Amapá, órgão que gerou o jornal Amapá e a Rádio
Difusora de Macapá.
Filiado ao Partido Social Democrático-PSD do Pará, Humberto
Vasconcelos foi guindado à condição de Presidente do Diretório Territorial da
referida associação política. Também integrou o grupo de cidadãos que fundou o
Rotary Clube de Macapá, sendo o primeiro presidente da entidade. O capitão
Vasconcelos usava uma prótese no braço esquerdo, que substituía a mão arrancada
por uma granada. Vestia-se com esmero, preferindo roupas brancas. Ficava
magoado quando alguém o chamava de mão-de-borracha. Humberto e Eleutério
mantiveram convivência cordial enquanto residiram em Macapá. O relacionamento
entre eles azedou em Belém à conta do clima político reinante do Pará. O Dr.
Paulo Eleutério era secretário de redação do Jornal Liberal, pertencente a
Magalhães Barata.
O capitão Vasconcelos atuava na oposição. A partir de
11/4/1950, os seguidores de Magalhães Barata, que dominavam o governo do Pará,
iniciaram uma brutal perseguição a seus adversários, chegando ao cúmulo de dar
um banho de fezes no jornalista Paulo Maranhão, dono do Jornal “Folha do
Norte”. O atentado foi engendrado por Armando Corrêa, secretário-geral do
governador Moura Carvalho. Em artigo publicado no jornal “O Liberal”, dia
19/5/1950, o articulista João Malato colocou em dúvida a masculinidade do
capitão Vasconcelos. Na manhã do dia 20, o capitão foi à redação do jornal para
tomar satisfações com Malato, mas não o encontrou. Foi então a sala de redação, onde se encontrava o jornalista Paulo Eleutério e, de revólver em punho, passou a agredi-lo verbalmente. Sentindo que as ameaças de morte do capitão fatalmente iriam se concretizar, Paulo Eleutério usou um velho revólver que pretendia levar ao um armeiro e atirou contra o capitão, atingindo-o sem
gravidade à direita e à esquerda da clavícula. Ao ficar sem balas, o jornalista tentou se refugiar na gerência do jornal,mas foi surpreendido pelo antagonista. Manuseando uma arma de melhor precisão, o capitão alvejou Paulo Eleutério na perna e nas costa,
matando-o. A 3/10/1950, Humberto Vasconcelos, filiado ao Partido Social Pogressista e compondo a Coligação Democrática Paraense, adversária de Magalhães Barata, elegeu-se deputado estadual com 5.018 votos. À conta da imunidade parlamentar adquirida como deputado estadual, Vasconcelos viu o processo instaurado no quartel-general da 8ª Região Militar e o processo judicial fluirem em camera lenta. Algumas testemunhas só foram ouvidas em 1954, quatro anos depois do crime. Ainda assim, testemunha chaves não foram ouvidas no processo militar.No dia 31/7/1951, ocupando a 2ª secretaria da mesa diretora da Assembléia Legislativa do Pará, Humberto Vasconcelos foi promovido ao posto de major do Exército Brasileiro. No transcurso do
mandato, ele foi absolvido pelo Tribunal de Justiça do Pará. Ao deixar a Assembléia Legislativa, sentindo forte rejeição por parte da sociedade paraense, o major Humberto Pinheiro de Vasconcelos retornou a Vitória-ES, onde nasceu a 27/5/1912. Quando assassinou o jornalista Paulo Eleutério, Humberto Vasconcelos estava lotado no Departamento Estadual de Segurança Pública. Faleceu no dia 26/1/2002, com 90 anos de idade.
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